Manual de Semântica (texto I)
Quando se fala em estudos do significado, o que vem logo à mente das pessoas envolvidas com questões de linguagens é a palavra semântica. Assim podemos afirmar com segurança que a semântica é bastante complexa e há dois fatores: o primeiro são as diferentes perspectivas teóricas que lingüistas e filósofos possuem acerca do objeto de estudo da semântica, o segundo fator é a falta de consenso quanto ao que seja significado. Os filósofos gregos foram os primeiros a abordarem questões relacionadas ao significado.
O termo semântico tem origem na palavra grega semantiké. Seu objetivo era bem claro: tentar compreender o conhecimento humano. Nessa busca pela compreensão da relação entre a linguagem e o conhecimento eles acabaram por realizar importantes reflexões acerca da palavra e do significado. Hermógenes fala a respeito dessa relação, idéia proposta por Crátilo que diz a respeito dos nomes, que eles são naturais e não convencionais.
Entretanto, conceber uma relação direta entre palavra e coisa é comportar-se de uma maneira demasiadamente simplista. Afinal, como é possível demonstrar-se a existência de uma relação natural e intrínseca entre uma palavra e um objeto, ao qual ela se refere, ou ao qual ela representa no pensamento? John Locke manifestou-se a esse respeito, lembrando que a função das palavras é permitir a comunicação entre pessoas e que as palavras resultam de convenções sociais.
Contudo, a explicação satisfatória sobre a relação entre a palavra e o significado foi a da visão convencionalista, segundo a qual o significado é arbitrário, determinado socialmente, convencionado pela comunidade lingüística. A convenção tem função reguladora importante dentro de um grupo social: ela restringe o número de opções. Sem a convencionalidade, os falantes e seus respectivos ouvintes não poderiam atingir uma concordância acerca daquilo que querem transmitir.
Diante disso, para a lingüística moderna o importante é a multiplicidade de significados, nelas está inseridas a polissemia, em que uma mesma palavra tem dois ou mais significados de acordo com o contexto, e a homonímia em que duas ou mais palavras de significados diferentes tem a mesma grafia e/ou a mesma pronúncia. Dessa forma o termo significado é fundamental para a semântica e não possui uma definição única e incontroversa, é natural que os outros termos acrescentem dificuldades de delimitação do seu objeto.
Semântica (texto II)
Neste capitulo abordaremos alguns fenômenos típicos da linguagem humana, como ponto de partida para analise, a dêixis. Observe; a madame de vestido turquesa está desde as duas horas da tarde na loja de confecções onde foi comprar um chapéu. São cinco horas e a balconista já buscou todos os chapéus disponíveis no estoque. Nesse momento a madame aponta para um dos primeiros chapéus que a balconista mostrou, o único verde de bolinhas roxas e diz:
(1) Fico com este.
(2) Às cinco horas da tarde, a madame de vestido turquesa fica com o chapéu verde de bolinhas roxas. As frases (1 e 2) veiculam “a mesma informação”.
Como explicar que essas duas frases sejam capazes de expressar a mesma informação se tão claramente diferentes? A explicação é obviamente, no fato de que, na nº1, o locutor “madame” em apontar fornece a forma de descrever que expressa na nº2. Tomando o demonstrativo este como exemplo típico desse fenômeno lembrando que ele vem acompanhado de um gesto de apontar. A lingüística moderna chama estas palavras e formas de dêiticos que realizam o fenômeno da dêixis (ato de mostrar), que distingue a linguagem humana das linguagens artificiais.
O fenômeno da dêixis dá as línguas naturais uma grande agilidade; em contra partida, as frases com elementos dêiticos só podem ser interpretadas em estreita conexão com situações determinadas, e as informações são transmitidas com a variar das situações. Assim essas observações distinguem o fenômeno da dêixis do fenômeno da anáfora, esta consiste em identificar objetos, pessoas, lugares. Embora haja em português, uma maioria de expressões que se usam ora, como anafóricas, ora como dêiticas, os dois fenômenos são distintos. Em certos casos os dêiticos e anafóricos distribuem-se em séries paralelas e intercambiáveis.
Contudo, a oposição entre a frase 1 e a 2 não se resume, num grau maior ou menor de concisão, ou na presença/ausência de dêiticos, importa reconhecer que os enunciados constativos e os performativos não podem ser descritos da mesma maneira. È a fenômeno desse tipo que os lingüistas se referem como atos da fala. Todavia, o fenômeno de acarretamento em que se inferi uma expressão com base no sentido literal de outra, este sentido passa obrigatoriamente pelo contexto conversacional, á fenômenos desse tipo denominamos de implicaturas.
Introdução ao estudo do léxico (texto III)
· Antonímia
Informalmente, as pessoas costumam chamar de antônimas quaisquer palavras ou expressões que podem ser colocadas em oposição: nascer, morrer; Grande, pequeno. Os antônimos formam pares que referem a realidades “opostas”, estas realidades pode ter fundamentos diferentes. Assim, na mesma escala: quente e frio, ou numa mesma ação bater, apanhar. Encontramos também antônimos entre os substantivos (duro, mole), adjetivos (bondade, maldade), verbos (dar, receber), advérbios (lá, cá), preposições (sobre, sob).
· Arcaísmo
Chamamos de arcaísmo as expressões que, tendo já sido de uso corrente na língua, caíram em desuso e quando usadas refletem um estado de língua mais antigo, geralmente aparecem com freqüência na literatura. È comum encontrarmos arcaísmo em todos os domínios da língua: vocabulários, morfologia, sintaxe... Com freqüência, as falas tipicamente regionais continuam usando formas e expressões que do ponto de vista da língua brasileira comum seriam arcaicas porque os objetos, as técnicas, e os hábitos correspondentes caíram em desuso.
· Homonímia
São aquelas palavras que se pronunciam da mesma forma e que escrevem de maneiras diferentes (cinto, sinto), (sessão, cessão, seção).Em alguns casos o uso de homônimos causam alguns problemas de comunicação, ou seja, a interpretação deve ser realizada de maneira cuidadosa.
· Polissemia
A polissemia se opõe a homonímia: ou seja, para que haja polissemia é necessária uma só palavra e de acordo com o contexto da mesma existam vários sentidos, então temos a construção polissêmica.
· Sinonímia
Os sinônimos são palavras de sentido próximos que se prestam ocasionalmente, para descrever as mesmas coisas e as mesmas situações. Mas é sabido que não existem sinônimos perfeitos: A escolha entre dois ou mais sinônimos dependem também das características regionais. Quando pronunciada uma palavra deve se tiver o cuidado de não ser mal interpretado devido ao sentido original desta palavra.
· Termos genéricos e termos específicos
Ao falarmos das mesmas realidades, podemos aplicar a essa realidade palavras que evocam conceitos mais ou menos abrangentes. Por ex: Caruso meu canário, é ao mesmo tempo um canário, um pássaro, um bicho, um ser vivente...
Interessa dispor da palavra hiponímia: na qual a palavra canária é hiponímia da palavra pássaro. A noção de hiponímia tem a ver com inclusão. Interessa também que em oposição aos termos específicos correspondentes, os termos genéricos são aqueles que aplicam o conjunto mais amplo de objetos (os lingüistas dizem que eles têm extensão maior), mas nos dão pouca informação sobre como os próprios objetos (compreensão menor): ficamos sabendo mais sobre as características de um animalzinho de estimação se ele for descrito como um canário, ficamos sabendo menos se ele for descrito, genericamente, como um pássaro.
Lexemas e Lexias. Lexias simples e complexas (texto IV).
No sistema abstrato da língua, distinguem-se dois componentes: o léxico e a gramática. De fato as palavras são entidades abstratas que compõem o sistema lingüístico. Por sua vez, os discursos são atos de linguagem transitórios, ao passo que a palavra é um elemento permanente da língua. O termo lexema é usado para designar a unidade léxica abstrata em língua.
No português são formas livres: os substantivos, os adjetivos, e os verbos e são formas dependentes (vocábulos e morfemas): As preposições, os pronomes pessoais, os artigos, as conjunções entre outros. Na prática alguns testes poderão ajudar detectar as lexias complexas, o primeiro é o teste de substituição, não podemos substituir os vocábulos bom dia e boa noite por outro adjetivo mais ou menos sinônimos, dizendo: ótimo dia e ótima noite, por conseguinte, tudo leva a crer que os mesmos já estão lexicalizados como lexemas. O segundo é o teste de inserção que não poderia inserir um advérbio em meio aos constituintes exp.: mercado “negro”, resultando mercado “muito” negro. Portanto, este também demonstra que estão lexicalizados. E seremos obrigados a chamá-los de lexias complexas.
O termo lexias simples será; pois reservado para as unidades que são grafadas com único segmento. A ortografia demonstra que o código escrito reproduz o código oral precariamente. Além disso, os contínuos desajustes, existentes no interior do sistema lingüístico, são patentes na notória incapacidade que tem o código escrito de reproduzir os lusco-fuscos da língua em ação.
A categorização léxica (texto V)
Qualquer sistema léxico é a somatória de toda experiência acumulada de sociedade e do acervo da sua cultura através das idades. Os membros da mesma funcionam como sujeitos agentes, no processo de perpetuação relaboração continuam do léxico da sua língua. Num processo em desenvolvimento, o léxico se amplia se altera e, às vezes, se contrai. As mudanças sociais e culturais acarretam alterações nos usos de vocabulários, e isso surge para enriquecer o léxico. Sobretudo no processo de aquisição da linguagem o léxico é o domínio na qual a aprendizagem é continua durante toda á vida do individuo.
Um dos processos comum da memória na da incorporação do léxico é o modelo binário de oposição, ou seja, a relação que o cérebro faz a determinadas coisas, exp. Ao falar em material escolar, o cérebro traz; caneta, borracha, livro, caderno, etc. Existe um tipo de afasia em que os campos onomasiologico das palavras parecem sofrer um total desmantelamento, acarretando a perturbação da estrutura interna dos subsistemas léxicos. O afásico nomeia um objeto através de outro signo verbal que faz parte do campo semasiológico das palavras. O afásico manifesta assim, incapacidade de encontrar a palavra requerida pela situação na memória léxica.
A categorização léxica e a estruturação do sistema lexical é matéria pouco, ou nada, conhecida, e até escassamente estudada pelos lingüistas. A organização das palavras por categorias são elaborações próprias de cada cultura e dela resultante. A análise diacrônica de um sistema lingüístico ocasiona muitas vezes, alterações e reformulações ordenadas do léxico dessa língua.
O significado. A estruturação do léxico (texto VI)
“As significações ditas léxicas de certos signos são apenas significações contextuais artificialmente isoladas ou parafraseadas. Todo significado de um signo nasce de um contexto, seja ele de situação ou explicito”. Assim, na maioria dos lexemas é possível distinguir exclusivamente conceptual, onde é feita referência explicita do conteúdo denotativo e/ou lógico e cognitivo dos dados da realidade. Também é possível detectar significados de uma palavra, na qual sobressaem partes conotativas que se reportam a elementos contextuais.
Na prática é por vezes difícil de distinguir o tipo de significação que ocorre em um dado contexto. A criatividade artística é capaz de explorar a significação de maneira tão original e desusada, que os escritores normalmente estão sempre ampliando o halo de significação de uma palavra, ou de seu campo semântico. Toda palavra abrange uma rede de significados. E mais ainda diferentemente da gramática é o léxico, pois o mesmo é um campo aberto.
Contudo, a onomasiologia visualiza os problemas sob o ângulo do que fala, daquele que deve escolher entre diferentes meios de expressões. Já a semasiologia focaliza os problemas do que ouve do interlocutor que deve determinar as possíveis significações da palavra que ele entende. Dessa forma, o enfoque onomasiologico é típico da Lexicologia. A lexicografia, porém, opera, sobretudo dentro da metodologia semasiologia. O confronto de um campo onomasiologico com os campos semasiológico afins demonstram que eles se interpenetram e se completam, contribuindo assim, para o estudo da forma de como o léxico se estrutura na língua.
O campo léxico (texto VII)
Uma noção de suma importância em lingüística é a de valor, que se encontra esboçada em Saussure (1977, p. 131). “cada termo lingüístico é um pequeno membro, em que a idéia se fixa num som e torna-se um signo de uma idéia”. Tratando das relações associativas, estabelece que os grupos formados por associação mental não se limitam a aproximar os termos que apresentem algo em comum; o espírito capta também a natureza das relações que os unem em cada caso e cria com isso tantas séries associativas quantas relações diversas existam.
Assim, um campo lingüístico é uma seção de entre mundo da língua materna, constituída pela totalidade de um grupo de signo lingüístico que coopera em articulação orgânica, na tentativa de classificar os campos léxicos que parecem mal delineados, uma vez que, não foi elaborado um método de campos léxicos. Pelas relações estabelecidas entre léxicos e cultura, a teoria dos campos se aproxima da hipótese de que a percepção que o individuo tem da realidade é condicionada pelo sistema lingüístico que ele fala: as categorias da língua fornecem como que subsídios para a interpretação do real.
Ainda assim, o sistema lingüístico não é simplesmente um veiculo reprodutor de idéias, mas o próprio modelador das idéias “o programa é o guia para atividades mentais do individuo”, para sua análise das impressões, para síntese de toda a sua bagagem mental. Dessa forma define-se dois conceitos: palavras testemunhas e palavras-chave. As primeiras são definidas como “elementos particularmente importantes em função dos quais a estrutura lexicológica se hierarquiza e se coordena”.
Por outro lado, uma palavra é “uma unidade lexicológica que exprime uma sociedade... um sentimento, uma idéia viva na medida em que a sociedade reconhece neles um ideal. O campo lexical é um paradigma lexical constituído por um conjunto de unidades lexicais que compartilham entre se uma zona comum de significação, fundada em oposições imediatas. A teoria merece destaque pelas explicitações teóricas que consolidam a lexemática e não se restringem a uma descrição direta e imediatista dos campos lexicais, pois é sofisticada com uma serie de distinções muito refinadas.
Sistema Lingüístico e Empréstimo (texto VIII)
Na relação entre duas línguas, a vizinhança ou coexistência espacial tende a modelar o léxico de uma ou de outra por um recorte analógico do mundo objetivo, e desta maneira cada língua conserva suas formas fônicas, porém introduz um novo conteúdo gramatical ou conceitual. Nós contatos raros ou sistemáticos, a interferência, embora em menor grau esteja sempre presente. Partindo das conseqüências destas relações os sistemas lingüísticos são classificados como:
Homogêneos (pouco receptivo a termos alógenos), Heterogêneos (receptivos aos termos alógenos, integrando-os e adaptando-o a sua estrutura), amalgamados (receptivos aos empréstimos de sistema semelhante ao seu). Eles se constituem o meio termo entre os dois extremos anteriores.
Referências
BIDERMAN, Maria Tereza Camargo. Teoria Lingüística: teoria lexical e lingüística computacional. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
CARVALHO, Nelly. Empréstimos lingüísticos. São Paulo: Ática, 1989. (Serie Princípios).
DUARTE, Paulo Mosânio Teixeira. Introdução a semântica. Fortaleza: UFC, Edições, 2000. (Serie Didática).
ILARI, Rodolfo. Introdução ao estudo do léxico: brincando com as palavras. São Paulo: Contexto, 2002.
ILARI, Rodolfo. ; GERALDI, João Wanderley: Semântica. 10ª Edição, 4ª Impressão: São Paulo: Ática, 2002
OLIVEIRA, Luciano Amaral. Manual de semântica. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.
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