EROTISMO NA POÉTICA DE FLORBELA ESPANCA
RESUMO
Este artigo retrata o erotismo apresentado na poética de Florbela Espanca através da analise dos poemas “Realidade” e “Se tu viesses ver-me hoje à tardinha”. A poetisa expressa o rompimento com o erotismo tradicional, numa perspectiva de revelar a emancipação literária da mulher, como também alargar as fronteiras do erotismo feminino. Uma vez que a autora utiliza-se de jogos de palavras numa maneira de fingir/revelar seus anseios e desejos amorosos, descrevemos, portanto neste estudo os sinais dessa evolução erótica.
Palavras-chave: Literatura. Poesia. Florbela Espanca. Erotismo.
Este artigo tem como objetivo analisar os poemas “Realidade” e “Se tu viesse ver-me a tardinha” retirados do livro “Charneca em flor” (1931), da poetisa Florbela Espanca, que pertence ao modernismo português. Na maioria de suas obras Florbela Espanca retrata a sensualidade, o confidencial, a feminilidade e a erotização, uma vez que, através destas temáticas, a autora buscou a emancipação literária da mulher e ousou levar ainda mais longe o erotismo feminino.
Os poemas citados anteriormente apresentam-se em versos com rimas e suas estrofes estão organizadas em tecetos e quartetos, ou seja, os poemas de Florbela quase sempre são sonetos, contudo, os versos não contêm uma métrica rígida.
Neste sentido, a poesia de Florbela Espanca vem expressar, através de palavras maliciosas e ao mesmo tempo provocantes, um sentimentalismo de um amor idealizado, também sonhado por diversas mulheres que almejam a libertação de suas angústias, vivendo, assim, relações amorosas ardentes.
Na primeira estrofe do poema “Se tu viesses ver-me hoje à tardinha”, a poetisa deixa transparecer um desejo direcionado a alguém que possivelmente não estivesse disponível no sentido de não completar ou satisfazer suas expectativas amorosas:
Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços...
(Espanca, 2005, p.69-70)
A segunda estrofe relata momentos de amor vivenciados, ao passo que descreve detalhadamente possíveis situações amorosas as quais fazem parte do passado, permanecendo apenas a saudade:
Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... O eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... Os teus abraços...
Os teus beijos... A tua mão na minha...
(Espanca, 2005, p.70)
É facilmente perceptível o erotismo na terceira estrofe, uma vez que a poetisa retrata uma relação de elementos sensuais como beijo, seda vermelha, canto e riso.
Se tu viesses, quando linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri
(Espanca, 2005, p.70)
É importante observarmos que o adjetivo “vermelho” está associado ao desejo. Conforme Octavio Paz (1994, p. 07), a chama vermelha é a do erotismo, que é sustentada pelo fogo original e primordial, a sexualidade, e que sustenta outra chama azul e trêmula, a do amor.
Outro aspecto que esclarece a presença do erotismo é a expressão “linda e louca” presente no primeiro verso desta estrofe, trazendo a idéia de uma mulher loucamente apaixonada que se sente linda aos olhos do objeto desejado.
A quarta e última estrofe deste poema visa intensificar o erótico já presente na estrofe anterior. As palavras “sol” e “desejo” respectivamente são exemplos marcantes da erotização neste poema:
E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...
(Espanca, 2005, p.70)
Também no poema “Realidade” Florbela utiliza as expressões “olhar”, “gorjeio”, “boca” e “frescura” num jogo de palavras com o intuito de demarcar a presença da sedução possivelmente feminina direcionada ao alvo almejado/desejado:
Em ti o meu olhar fez-se alvorada
E a minha voz fez-se gorjeio de ninho...
E a minha rubra boca apaixonada
Teve a frescura pálida do linho...
(Espanca, 2005, p.66)
No poema “Realidade”, com a expressão “cabeleira desatada”, expressa no segundo quarteto, a poetisa sugere a presença de movimentos bruscos, característica própria da paixão:
Embriagou-me o teu beijo como um vinho
Fulvo de Espanha, em taça cinzelada...
E a minha cabeleireira desatada
Pôs a teus pés a sombra dum caminho...
(Espanca, 2005, p.66-67)
Na terceira estrofe, Florbela descreve uma mulher apaixonada, para isso, ela utiliza partes marcantes do rosto como “pálpebras” e “olhos” como elementos chave da sedução:
Minhas pálpebras são cor de verbena,
Eu tenho os olhos garçons, sou morena,
E para te encontrar foi que eu nasci...
(Espanca, 2005, p.67)
Neste momento sobressai a caracterização da cor morena, reforçando a ideologia da sociedade de que a mulher morena corresponde a um toque adicional de fascínio.
Na ultima estrofe, a poetisa evidencia uma situação de explosão/declaração dos desejos existentes, antes apenas secretos e agora declarados:
Tens sido vida fora o meu desejo
E agora, que te falo que te vejo,
Não sei se te encontrei... Se te perdi...
(Espanca, 2005, p.67)
Logo no último verso, Florbela Espanca expressa a desilusão de alimentar um sentimento talvez não correspondido, ao ponto de ser finalizado sem sequer ter tido um começo.
Estes poemas mostram características marcantes da poética de Florbela Espanca, pois, como expressa Massaud Moisés (2005, p. 253), “trata-se duma poesia-confissão, através da qual ganha relevo eloqüente, cálido e sincero, toda a desesperante experiência sentimental duma mulher superior por seus dotes naturais fadada a uma espécie de “dujanismo ferminino”, ou seja, a poetisa se revela e expõe o desejo ardente da vivência de uma louca paixão presente nela e em muitas mulheres.
A poetisa utiliza bastante, e com eficácia, circunstâncias que evidenciam o contato do corpo, citando versos com perfeitas rimas, envolvendo partes do corpo que supostamente seriam postas em contato intenso, característica esta que demonstra o quanto o erotismo feminino se destacou neste período, tanto na autora quanto nas demais mulheres da época. Este erotismo é visualizado hoje com maior intensidade, sobretudo na prática de exposição do corpo.
REFERÊNCIAS
ESPANCA, Florbela. Sonetos. São Paulo: Martin Claret, 2005.
MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. 33 ed. São Paulo: Cultrix, 2005
PAZ, Octavio. A dupla chama: amor e erotismo. Trad. Wladir Dupont. São Paulo: Siciliano, 1994.
http://www.luso-poemas.net/modules/news03/article.php?storyid=588
Acesso em: 04/02/2011 Ás: 21:47
http://marciaapinheiro.tripod.com/real.htm
Acesso em: 05/02/2011 Ás: 18:25
Produzido por:
Jackeline Amorim; Lucineide Pereira e Mariana Lima.
Graduandas do Curso de LETRAS VÉRNACULAS, na UNEB XIII
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